Sendo esta a crise mais profunda que a geração actual está a passar, com dúvidas, incertezas e sermos confrontados com os nossos próprios hábitos de vida, abre-se também uma janela. Por uma fresta desta janela, podemos ver em vários cantos Heróis a nascer e a trazer ao de cimo o melhor de nós. Afinal de contas, como deveríamos ser sempre.
Num prédio em Cascais, uma moradora decidiu investir num plano de apoio aos residentes do prédio que, neste momento de crise, estejam mais impedidos de sair de casa por serem considerados grupos de risco e com menos imunidade ao COVID-19, ou até apenas pela idade avançada.
Uma folha A4, solicitando voluntários do prédio para que possam efectuar as compras a outros moradores que não possam, ou devam de todo, evitar os percursos e a permanência em locais com outras pessoas. E assim em poucas horas nasceram quatro Heróis.
Desta forma, a autora desta ideia está a conseguir criar uma micro-sociedade de apoio que em tempos idos tinham o nome técnico de “vizinhos”.
O Portal Cascais teve conhecimento e deslocou-se ao local pedindo ainda uma reacção à autora desta ideia.
PC – Ana, qual o “clique” que despoletou esta ideia?
Ana Paula – Trata-se de um momento difícil para todos e onde rapidamente assistimos a um desequilíbrio nos comportamentos das pessoas. Se assistimos a pessoas a atropelarem-se para comprar papel higiénico, então temos de perceber como os nossos idosos e pessoas pertencentes a grupos de risco conseguem ter igualdade. No nosso prédio temos algumas pessoas com idades mais avançadas e percebi que este é o momento de cuidarmos uns dos outros.
A ideia não é de todo minha. Vi outra acção semelhante, através das redes sociais, noutro edifício e não pensei sequer duas vezes para replicar a ideia.
PC – Foi preciso uma crise, para estes movimentos surgissem?
Ana Paula – Como deve imaginar, não estou a inventar nada. No tempo dos meus avós, isto era o normal. A minha avó contava-me histórias do tempo da segunda grande guerra em que todos viviam dificuldades mas ajudavam-se uns aos outros. Tudo se ultrapassava, com imensa dificuldade, mas com espírito de entre-ajuda. Ao fim ao cabo estamos apenas a ser “vizinhos” uns dos outros na plenitude da palavra. O facto é que em pouco mais de 10 horas já somos 4 voluntários no prédio.
Pedimos à Ana Paula para tirar uma fotografia para o nosso Portal, contudo a mesma recusou, justificando que este é o momento colectivo e não da unidade. “Se quiserem seguir o meu exemplo, basta compreender a acção e o momento. A minha cara não deverá ser neste momento símbolo para nada”, acrescentou Ana Paula.