Lisboa, Capital Verde Europeia?

 

Esta semana, com pompa e circunstância, recebendo o secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres, e o Vice-Presidente da Comissão Europeia para o Green Deal, Frans Timmermans, Lisboa consagrou-se como como a Capital Verde Europeia (2020).

Pela primeira vez uma cidade no sul da Europa recebe este galardão e os objectivos a que se propõe são genericamente positivos porém, e há um abismal porém, se olharmos estruturalmente para o que o município necessita para garantir um excedente climático, isto é ultrapassarmos a barreira da neutralidade carbónica, e o que efectivamente está a fazer está longe de garantir a acção necessária.

O município, tal como o país, continua a ignorar o facto de ainda termos taxas de consumo de bens e serviços muito acima dos limites sustentáveis da real economia, das taxas de reciclagem e de gestão ecológica de resíduos estarem longe das ideais, de se continuar a externalizar o impacto do aumento do tráfego aéreo (sem falar na expansão da Portela para o aeroporto comercial no Montijo), automóvel tal como de barcos e cruzeiros, da expansão da poluição luminosa e do crescimento das emissões de gases poluentes, tal como da poluição generalizada do lixo urbano, por exemplo com os resíduos plásticos e beatas.

Importa também alertar para a morte gradual do rio Tejo e a destruição maciça dos nossos oceanos com a sobrepesca e poluição generalizada.

Isto sem esquecer da falta de visão política para implementar soluções que estruturalmente protejam a biodiversidade e a coexistência harmoniosa de mais espécies animais e vegetais no município. Sim as metas a que se propõe Lisboa são audaciosas mas pouco se deve esperar de um executivo que mantém a mesma forma de pensar, agir e gerir os recursos que nos trouxe para este caos climático.

Dizer que Lisboa é um exemplo de cidade ecológica ou que caminha para a neutralidade carbónica, tendo o rótulo de Capital Verde Europeia, é só assumir que a metrópole está na rota para não poluir tanto como outras capitais.

Não representa, muito menos garante, que a neutralidade carbónica seja atingida, que os valores de poluição sonora, atmosférica e luminosa diminuam drasticamente, que a educação e a mobilidade sejam políticas estruturais do município, nem que as políticas de gestão de resíduos ou mesmo de preservação da biodiversidade sejam eficazes e duradouras.

Aqui, como em tantos outros exemplos, o rótulo de verde pouco significa se a Câmara PS mantiver e reforçar o paradigma de consumo exacerbado, de externalização ambiental e de crescimento contínuo.

Felizmente para o ano teremos eleições autárquicas e podemos, como cidadãos/ãs, dar mais força, através do voto, a partidos com políticas ecológicas holísticas e que tenham uma visão estrutural de como devemos implementar uma sociedade baseada na descentralização da produção, distribuição e consumo de energia e de bens alimentares, de como desenvolver PMEs que acrescentem mais valor nesta transição económica e social, de como reduzir o nosso consumo de bens e serviços, de como reforçar a integração das comunidades nas decisões políticas, de como melhorar estruturalmente a mobilidade urbana e peri-urbana, de como garantir que o turismo não externaliza os seus impactos para quem mora no território, de como projectar as construções e as políticas de habitação para todos os cidadãos e, naturalmente, de como desenvolver os municípios como espaços de coexistência entre mais espécies animais e vegetais.

Queremos cidades vivias, desenvolvidas e prósperas, não amorfas à loucura do consumismo e do crescimento pelo crescimento.

Como nota final frisar que estreou, no Cinema São Jorge, como parte da semana inaugural de Lisboa como Capital Verde Europeia, o documentário É P´ra Amanhã, que nos fala em vários episódios sobre a urgência de transitarmos para uma sociedade e economia realmente sustentável, progressista e descarbonizada mostrando alguns dos muitos exemplos positivos que já operam e se expandem em Portugal.

Francisco Guerreiro

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