A Caça às Bruxas

 

O período conturbado em que vivemos está a transformar o país num local de caça às bruxas. Cascais não é exceção. Ao mínimo sinal de um ajuntamento de jovens, exaltam-se os ânimos, chama-se a polícia e proíbe-se mais alguma coisa.

A proibição da venda de bebidas alcoólicas nos postos de abastecimento em Cascais, isto ainda antes das medidas recentemente anunciadas pelo governo, é um exemplo disso mesmo.

Vamos ser francos. O problema da aglomeração de jovens em postos de abastecimento, com o barulho, incómodo ou insegurança que possam causar a outros munícipes, não é um fenómeno recente.

Esta situação, como muitas outras semelhantes, tem sido motivo de repetidas queixas por parte dos munícipes, muito antes da crise sanitária atual, mas nunca houve coragem de resolver este género de problemas. Agora é fácil acusar aqueles de quem não gostamos, os que fazem barulho à noite, ou bebem, ou são apenas jovens, com o papão do vírus.

É que se o problema fosse verdadeiramente o da aglomeração em postos de abastecimento e das suas eventuais consequências para a saúde pública, há muito que se teria encontrado uma solução para os autocarros lotados que circulam no concelho de Cascais todos os dias, uma situação que é potencialmente muito mais perigosa para a saúde.

Mas aqui, só agora a gestão autárquica se indignou publicamente sobre a situação, sem que haja um plano para alugar autocarros (como se comprou ou alugou tanta outra coisa recentemente) para aumentar a oferta em horas de ponta.

É que não fica bem criticar os insuficientes transportes coletivos (já eram insuficientes antes da crise sanitária), mas cuja gratuitidade (para os utilizadores) tem sido uma das bandeiras da atual coligação que gere a autarquia.

A caça às bruxas não se fica por aqui. Assistimos agora a todo o género de comentários, muitas vezes fortemente xenófobos, sobretudo em redes sociais onde Cascais não é exceção, contra à vinda de “estrangeiros”, de “brasileiros”, de “trabalhadores das obras” ou de pessoas de “outros concelhos”. Como se os mesmos fossem a causa da crise sanitária que atravessamos. É fácil acusar desta maneira, como era fácil acusar as “bruxas” de séculos passados.

Enquanto caminharmos para uma sociedade onde a informação é propositadamente controlada para fins políticos, e onde se continua a fomentar este ambiente apocalíptico de medo e receio, vai ser difícil convencer aqueles que hoje acreditam em bruxas que as mesmas não existem. E a caça às bruxas vai continuar. Mas é inaceitável.

 

Miguel Barros